sexta-feira, setembro 30, 2005

«O Cícero de uma divagação varzinista»

a opinião de Luís Leal*
Imagem: Foto Alberto e Fernando

Esta Liga de Honra está mesmo a ganhar os esperados contornos do campeonato das incógnitas. Com o novo figurino de terem de descer seis equipas – um caso nunca visto no futebol português e talvez internacional – e de subirem apenas duas, o Campeonato vai ficar a ferro e fogo, pois tão depressa uma equipa está a lutar pela subida como pode aparecer, de um momento para outro, a braços com a descida de Divisão.
Veja-se a amostra que nos dá a quinta jornada, uma pequeníssima parcela das 34 que completam a prova do futebol nacional mais incaracterística pelo seu ineditismo. No comando voltou a isolar-se o Sporting da Covilhã, uma das equipas recentemente promovidas e que no seu historial das últimas épocas anda sempre no sobe e desde sem atingir o escalão principal que o pode recordar mas de longa data. Do tempo do Cabrita, Rita e outros jogadores que passaram pelos grandes clubes portugueses.
Na cauda da classificação lá está isolado, apenas com 3 pontos, o Moreirense, que nos últimos anos andara a fazer figura na alta-roda do futebol lusitano.
Quanto aos mais recentes despromovidos, o Beira Mar está logo a seguir aos dois lugares da promoção e, mais abaixo, em quinto, encontra-se o Estoril, com duas derrotas entre três vitórias.
No entanto, deve levar-se em consideração que um dos mais teimosos a prometer nos menos longínquos anos a subida de Divisão, já está em 2.º lugar, o Leixões de grandes tradições no futebol nacional e que “morde os calcanhares” ao guia, apenas distante um ponto.
Posto isto, resta acrescentar que o repescado Gondomar (que joga na Póvoa no próximo Sábado) está a três pontos dos lugares da promoção, melhor posicionado que o Varzim num ponto e em dois lugares, quando o outro despromovido do ano passado que também beneficiou do mal dos outros para se manter neste escalão, o Chaves, tem cinco pontos, apenas menos dois que a equipa poveira.
Voltando para o que toca no nosso âmago, o Varzim, ao ser atingida a quinta jornada está mais perto da zona da despromoção (separado apenas dois pontos) do que do duo da subida (a quatro de distância).
Derby do Mar injusto na distribuição dos pontos
Podia o Varzim, nesta hora, estar a dois pontos da promoção, caso tivesse apontado o penalti que o teve a seu favor no jogo de domingo, em Matosinhos, e com isso evitar a derrota transformando-a em empate, já que nessa altura havia menos de um quarto de hora para terminar o encontro e o Leixões já se mostrava desgastado, ao contrário do Varzim que, mesmo lutando contra o infortúnio, mostrou mais capacidade física na luta pelos pontos.
Mas a sorte não esteve do lado poveiro, num “derby” da gente do mar que acabou por ser injusto na distribuição de pontos. Tudo porque Cícero não converteu em golo a grande penalidade. Ele que já tivera marcado uma no início da recuperação do resultado no Marco de Canaveses, abrindo a porta para o empate a 2-2. O mesmo Cícero que na jornada anterior à de Matosinhos, na Póvoa, dera a vitória ao Varzim com um golão frente ao Estoril. Desta vez não foi tão feliz, ou melhor, foi deveras infeliz em apontar o castigo máximo, permitindo a intervenção do guardião leixonense.
Muito particularmente confesso que gosto do nome de Cícero. Não por se tratar de um jogar do Varzim que, nascido no Brasil há 29 anos, andou em Portugal pelo Seixal e pelo União da Madeira onde Horácio Gonçalves o conheceu. Também não por ser uma pedra fulcral no actual plantel varzinista. Nem tão pouco por ter sido Cícero (melhor dizendo, Marco Túlio Cícero), na era antes de Cristo, um político, jurista e orador romano, bravo na escrita e nas palavras, ao ponto de depois de morto lhe terem picado a língua com agulhas.
Luís Leal sobre Cícero: «Não é por ter falhado a grande penalidade que o vou menosprezar (...) é um jogador do Varzim, tal como os outros (...) há que depositar confiança na nossa equipa»
Se a escrita já me toca na pele, o Cícero que mais andou envolvido na minha vida profissional, desde tenra idade, relacionava-se com a arte tipográfica, aquela arte que tem (ou tinha) o privilégio de “pôr os tipos em ordem” e até de “fazer impressão a todos os tipos”. Um cícero correspondia à medida-base da tipografia, também conhecida, no norte, por quadratim. Era correspondente a doze pontos no Norte e a oito no Sul (até nisto havia divisão geográfica em Portugal), nas medidas que guiavam os tipógrafos e que mesmo agora, com toda a modernização das tecnologias, derrama as suas origens nos tipos de letra a escolher nos computadores.
Que me desculpe quem lê esta divagação. Mas o certo é que quando o Varzim contratou o Cícero, logo me veio à lembrança o tal cícero/quadratim tipográfico que se arreigou de tal forma dentro de mim desde adolescente que mesmo agora não sou capaz de o esquecer. Por isso é que o Cícero caiu cá no meu goto. E mais ainda quando marca golos pelo Varzim.
E não é por não ter convertido a grande penalidade contra o Leixões que o vou menosprezar. Porque, neste caso, acima de tudo, é um jogador do Varzim e como tal, todos nós que sentimos palpitar um coração varzinista, temos de estar pelo seu lado, porque todos os jogadores juntos formam aquela equipa em quem depositamos a confiança capaz de a tornar mais perto da subida do que da descida de Divisão – o que não acontece infelizmente nos tempos que correm, mas com tendência para melhorar e poder dar melhor conta do recado.
*Jornalista do Comércio da Póvoa e director do jornal «O Varzim» escreve habitualmente neste espaço às quintas-feiras. Esta semana, por motivos técnicos alheios à nossa vontade, a crónica de Luís Leal só é publicada já na sexta-feira. Por esse motivo, o nosso pedido de desculpas aos leitores do blog.

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